por Margarida Chagas Lopes
À medida que se vai tornando mais evidente a armadilha da austeridade, sem que os decisores de política económica saibam nem queiram daí tirar as inevitáveis consequências, muito especialmente quando em regime de “assistência” internacional sob a égide das atuais troikas, duas coisas se tornam claras: ao contrário do que nos têm feito crer, há alternativas à política económica vigente; a sua adoção exige um corte inequívoco e consequente com a ideologia e a praxis neoliberal. É, assim, possível caminhar para um modelo de crescimento sustentável que crie emprego e que afixe como objetivo central o respeito pela qualidade de vida dos cidadãos e pelos direitos sociais básicos. Em determinadas condições, será mesmo possível caminhar nessa direção sem por de lado o até agora incontornável objetivo de controlo do défice orçamental, o qual de resto não se mostra atingível com as atuais políticas.
É toda uma conceção estratégica alternativa que se exige, em vez de medidas descontinuadas, inconsistentes e contraproducentes como temos assistido em matéria de emprego. É preciso, desde logo, inverter a tendência de queda do investimento produtivo, tanto nacional como estrangeiro. Uma reforma fiscal que favoreça menos o investimento financeiro e que torne mais atrativa a canalização dos lucros – dos sectores financeiro e não financeiro – para a formação bruta de capital é, portanto, indispensável. Do mesmo modo que é urgente adotar uma política fiscal efetivamente progressiva sobre os mais altos rendimentos, a propriedade e os ganhos financeiros, reduzindo os privilégios rentistas, e absentistas, dos 1% da população no topo da escala de rendimentos. Uma tal opção política trará de imediato dois efeitos: o aumento das receitas fiscais e o estímulo ao investimento produtivo, com ganhos óbvios sobre o emprego a médio prazo.
Ao contrário do que afirma e pratica a conceção mainstream, também a crescente liberalização dos direitos do trabalho e o enfraquecimento dos direitos sociais são contrários à criação de emprego e ao crescimento sustentado, ainda mais quando implementados em contra ciclo. A curto prazo, reforçam a precariedade e o trabalho não digno e favorecem o desemprego, mercê de cláusulas cada vez mais favoráveis ao despedimento e ao enfraquecimento da negociação social. A médio prazo, impedem também o crescimento e o emprego ao minarem as bases da procura interna. Ora esta é, com efeito, a mola real daquele modelo alternativo, ao sustentar as expectativas empresariais e o investimento produtivo, sobretudo das pequenas e médias empresas, já de si sufocadas pela política de forte restrição de crédito bancário… à produção. Como é óbvio, o estímulo à procura interna é incompatível com o corte e a desvalorização salariais, assim como com o enfraquecimento progressivo dos montantes e da acessibilidade às prestações sociais. Perante a iminência de quebra das exportações para a Europa e os Estados Unidos, alguns países da América Latina, e mesmo a China, vêm ensaiando com sucesso medidas de promoção da procura interna através do reforço de alguns direitos do trabalho, como a subida controlada do salário mínimo… O que deveria ajudar os decisores a refletir sobre as incongruências das atuais políticas.
Trata-se, em suma, de convergir na ação e empenhamento cívicos para erradicar de vez a ideologia neoliberal e a economia mainstream, contrapondo-lhes uma alternativa democrática e inclusiva porque centrada no crescimento e no emprego.