Conclusões

Promovido pelo CDA este encontro realizou-se a propósito dos 35 anos do SNS. Juntaram-se profissionais, ativistas ou simples cidadãos de várias correntes da esquerda para discutir o futuro do SNS.

Discutiu-se o acesso, o financiamento e a governação.

No acesso observou-se o desajuste entre a legislação, os relatórios e a realidade.
Tomar medidas para o ajuste aos números reais, implica a necessidade de contratação de profissionais. No entanto, cada doente não é um número. O seu caso, em termos sociais, localização geográfica, doença, tem que ser considerado de forma especial para cada pessoa.

Os nossos indicadores são bons e houve um salto enorme com o 25 de Abril e a criação do SNS. Em 1970 tínhamos 8.176 médicos e em 2010 já eram 41.471. Mas… temos de estar alerta. Desde 2011 houve uma pequena subida da mortalidade infantil, a taxa bruta de mortalidade aumentou, a tuberculose aumentou em 6 distritos de 2011 para 2012.

As Unidades de Saúde Familiar (USF’s) são um tipo de organização que dá satisfação a doentes e profissionais. No entanto, sabe-se que 68 aguardam abertura desde que este Governo entrou em funções. É necessário abrir essas e outras USF’s.

A vida humana prolongou-se, as doenças mudaram. A prevenção é hoje uma das formas de evitar algumas doenças da segunda metade da vida, evitar a morte precoce e sobretudo um prolongamento de vida sem qualidade. O Ministério da Saúde gasta menos de 1% em prevenção. É necessário que no financiamento esta percentagem aumente.

E quanto às estatísticas cite-se Marc Twain: há a verdade, há a mentira e há as estatísticas… Bem torcidas elas confessam tudo…
E sobretudo nós não temos hoje as consequências globais da actual realidade na saúde e dos cortes realizados. Teremos em 2015, 2016, 2017 e mais tarde. Tarde demais. É necessário observar a realidade hoje e cada caso hoje, independentemente das estatísticas.
Por isso o financiamento da Saúde tem que corresponder a um mínimo das necessidades.

Em milhões de Euros temos:

2006: 7.636 2010: 8.698 2014: 7.582

O corte que foi estabelecido no primeiro memorando da Troika em 2011 (550 milhões) está largamente ultrapassado. Cortou-se muito mais.  O orçamento anual da Saúde é praticamente o mesmo que o destinado aos juros anuais do pagamento da dívida (7.000 milhões). Este sub-financiamento leva a défice. E o défice leva a dívidas que crescem de ano para ano. E os resultados líquidos só se refletirão nas contas nacionais em 2015…

Tem de haver um compromisso de um futuro governo para voltar a nível de 2010. Mesmo assim significa um esforço, dado o aumento de custos de medicação e tecnologia que entretanto já existiram e existirão.

Nas perspectivas de evolução do SNS considera-se que:

  • Este deve continuar a ser dependente do Orçamento Geral do Estado e portanto dos nossos impostos. A nossa receita de impostos tem pois que ser considerada no sentido de não ser utilizada de forma completamente distorcida em pagamento de uma dívida impagável, sempre a crescer, com taxas de juros especulativas.
  • Assim sendo, deve ser universal e gratuito, sem taxas moderadoras, que são penosas para os utilizadores e têm pouco significado para o orçamento da Saúde.
  • Deve haver uma separação do público e do privado, sem que o público ande a alimentar o privado com pagamento de serviços e através da ADSE. Para tal, o público tem que se equipar para dar resposta às necessidades.
  • O financiamento tem que corresponder a um mínimo. Está há vários anos abaixo da média da OCDE. Mesmo assim, é sustentável e rentável.
  • Tem de haver descentralização com autonomia de gestão a nível das unidades.
  • O planeamento geral é central, mas a gestão deve ser periférica e autónoma.
  • As consultas devem ser multidisciplinares (médico, enfermeiro, psicólogo, nutricionista/dietista, assistente operacional).
  • Tem de haver empoderamento dos doentes e possivelmente aplicação do orçamento participativo nas unidades dos Centros de Saúde. 
  • O ambulatório hospitalar deve ser privilegiado incluindo a área cirúrgica.
  • A prevenção e a integração da Saúde no planeamento geral da sociedade são fundamentais (declaração de Alma-Ata).

Ficaram em discussão aberta alguns aspectos de governação:
  • O papel das Administrações Regionais de Saúde (ARS’s)
  • O papel da Administração Central de Sistemas de Saúde (ACSS)
  • A constituição de Unidades Locais de Saúde (ULS’s) que englobam hospitais e Centros de Saúde e qual o seu funcionamento.
  • A continuação ou não dos Agrupamentos de Centros de Saúde (ACES)

Isabel do Carmo, março de 2014