Crise, Desigualdades Sociais e Alternativas Socio-políticas


por Isabel Carvalho Guerra(*)

Há hoje uma grande diversidade de estudos nacionais e internacionais sobre o impacto da crise nas desigualdades sociais. Utilizando informação disponível nos várias organismos internacionais (OCDE, OIT, EU, etc.), é possível concluir que, em Portugal, a crise económica actual e, sobretudo, as medidas de combate à crise são particularmente penalizadoras para os grupos sociais mais pobres. Esta situação contrasta com outros países também com fortes medidas de austeridade, como a Irlanda, a Grécia, a Estónia, a Espanha e até os Reino Unido, onde as medidas de combate à crise estão atentas às famílias de menores rendimentos[1]. Como se pode provar pela informação disponível, em Portugal, e inversamente a outros países também sujeitos a medidas de austeridade, são os quintis mais pobres que são mais atingidos pela crise, afectando dentro desses grupos particularmente as crianças e os mais velhos. O risco da pobreza cresceu em populações em idade activa em Portugal e na Irlanda e menos na Estónia e em Espanha.
Esta desigualdade não é uma realidade de cariz social, compromete o sistema económico, politico, socio-simbólico e identitário, exigindo por isso respostas a todos os níveis da sociedade portuguesa. Ora, as políticas actuais em Portugal, as cadeias de comando politico e económico amarradas por grupos de interesse clandestinos, a existência de um “bloco central partidário” (incluindo os 3 maiores partidos que há décadas partilham a governação), imerso em teias corporativas afastadas do interesse público e o modo de funcionamento da economia de mercado monopolizado pelos grandes sectores publico/privados, não fornecem alternativas nesta fase histórica aos fenómenos de desigualdade detectados. Acrescente-se que o contexto internacional e europeu nada mais faz do que reforçar a lógica de funcionamento de um modelo de acumulação mundial cada vez mais desigual.
Equacionam-se, assim, os desafios deste momento histórico onde a descoberta de novas relações entre o económico, o social e o político e o ambiental; a alteração das culturas organizacionais, incluindo o desenvolvimento das dimensões de acção colectiva e de projecto; e as dimensões de alargamento dos espaços de poder e de gestão do quotidiano, emergem como alternativas fundadoras de um novo modelo civilizacional.

Assim, e considerando a amplitude e a inovação exigível às questões passíveis de aprofundamento no Congresso das Alternativas, propõe-se como discussão:
● A criação de um partido “conjuntural” que, desafiando a lógica partidária instituída na Europa e em Portugal, reúna no seu seio as alternativas e o descontentamento popular e se apresente a eleições em 2014 (parlamento europeu) e 2015 (Assembleia da Républica), (temos como referencia nacional o PRD e como internacional, apesar das contradições, o “partido pirata” alemão);
● O aprofundamento da possibilidade de iniciar uma moeda local a partir da rede das ONGs, com paridade com o euro e centrada na transacção de produtos nacionais - sabemos que no mundo há mais de 500 moedas locais em vários países, sendo famosas no Brasil as mais de 70 moedas, os LETS (Local Exchange Trading System) no Canadá e que, na própria Suíça, o BNB - moeda alternativa da rede de economia social – se mantém desde a segunda guerra mundial, com peso na economia local;
● O desenvolvimento de “laboratórios locais”, liderados por empresas e pela rede social, como terrenos de experimentação e de desvendamento de novas e emergentes dimensões, que poderão formatar os novos modelos de desenvolvimento.



(*) Professora Catedrática e Investigadora do DINAMIA/CET do IUL/ISCTE.
[1] Ver particularmente os mais recentes relatórios da OIT e o estudo do ECOMOD, (2011), The distributional effects of austerity measures: a comparison of six EU countries, OCDE Publications.