Como assegurar o financiamento da economia no contexto da denúncia do Memorando? A dívida tem mesmo de ser renegociada? Que dívida? Só a dívida pública? E a dívida bancária?
Parece-me claro que Portugal só sairá desta crise com um Orçamento de Estado equilibrado (défice 0 no OE) e uma balança de pagamentos equilibrada. Só assim seremos independentes. Aqui apresento algumas propostas de medidas simples que considero exequíveis por um governo saído de um contexto de denúncia do Memorando, sem alterar o sistema capitalista
1. Orçamento de Estado equilibrado. Entre as medidas para equilibrar o OE está a redução do serviço da dívida. Esta parcela tem, actualmente, um valor superior a 5% do PIB (10% do OE) e vai crescer assumindo valores exorbitantes e incomportáveis quando se iniciar o pagamento dos juros do memorando. Ora a dívida pública tem crescido nos últimos anos e será agora próxima de 200 mil milhões de euros (200 G€). A renegociação de dívida pública é uma condição indispensável para baixar este serviço da dívida. No meu entender, nas actuais condições, o OE português suportará um serviço de dívida de cerca de 6 G€ o que corresponde a um juro próximo de 2% (4 G€ para juros iniciais) e 2G€ para amortização da dívida. Este deveria ser o sentido de uma renegociação. Não precisamos de perdão da dívida, só precisamos de não pagar juros especulativos. Com este esforço anual de 6 G€ pagaríamos a totalidade da dívida em pouco mais de 60 anos. Esta parece-me uma proposta equilibrada e pouco radical, passível de ser aceite pela comunidade internacional, se a compararmos com o perdão de parte da dívida grega. Reduzir o serviço da dívida para 6 G€ permitirá libertar 3 G€ (este ano) para outras parcelas ou para o equilíbrio do OE e evitar muitas das medidas recessivas sobre a economia.
2. Balança de pagamentos equilibrada. A balança de pagamentos inclui a balança comercial e as balança de transações financeiras.
2.a Balança comercial. A recessão com o desemprego e a baixa de consumo já obrigou a um equilíbrio da balança comercial. Mas este equilíbrio será temporário se não se tomarem medidas de apoio à reconstrução do nosso tecido produtivo. Algumas medidas serão possíveis num quadro de país independente, mas outras necessitam de uma renegociação de acordos internacionais no sentido de evitar o dumping social, ou seja, penalizar a importação de produtos baseado na sobre-exploração do trabalho (mão-de-obra barata ou quase escravatura).
2.b Transações financeiras. Com o equilíbrio do OE e da balança comercial, o equilíbrio dos fluxos financeiros deixará de ser decisivo para uma economia independente. No entanto a saída da riqueza aqui criada, seja sob a forma de juros dos empréstimos da banca ou de particulares, seja transferências de lucros de empresas estrangeiras ou simples depósitos, prejudica o financiamento da economia e deverá ser evitada. Entre outras medidas, poder-se-á aplicar às dívidas da banca e particulares, uma renegociação semelhante à acima proposta para a dívida do estado, juro de 2% com pagamento prolongado. Uma medida destas pode implicar a intermediação do estado como garante do pagamento ao exterior. Esta garantia deverá ser acompanhada de participação do estado na gestão dos bancos e empresas apoiadas.