Notas soltas sobre democracia participativa

por Isabel Castro

A democracia pressupõe funcionamento aberto das instituições, participação dos cidadãos, pluralismo. E o respeito pela liberdade, enquanto garantia de condições para o seu exercício: ou seja repartição justa da riqueza, acesso com dignidade a sistema de educação, de saúde e de proteção na velhice. Ainda, solidariedade para com as gerações futuras. 

Dito isto, há uma crise de representação, de confiança, de proximidade em Portugal. Não se circunscreve aos titulares de órgãos de soberania, antes atinge quase todas as esferas da vida pública: sindicatos, magistratura, ONGD, administração. A generalizada desconfiança dos cidadãos nas instituições, o divórcio crescente entre representantes e representados e daqueles com a sociedade, a existência de desigualdades profundas a par da perceção de impunidade e de falta de credibilidade de muitos dos atores sociais, estão profundamente enraizadas na sociedade. São inerentes a uma sociedade com fraco nível de desenvolvimento. Só uma sociedade mais transparente, i.e., com maior acesso à informação, daí, com maior envolvimento dos cidadãos (individual ou coletivamente) nas tomadas de decisão e na vida pública, pode gradualmente devolver às instituições a sua credibilidade, torna-las mais fortes, responsáveis, gerar uma dinâmica social distinta, requisito essencial para o desenvolvimento. 

Propõe-se: 

1. Generalizar o sistema de limitação de mandatos executivos (na Administração Central, Regional e Local). A medida deverá alargar-se a todas as esferas da vida pública, nomeadamente outras organizações sociais, como os sindicatos, as organizações não-governamentais, as associações, etc. 

2. Criar, aprofundar e multiplicar os mecanismos de participação e envolvimento dos cidadãos, das associações cívicas e dos órgãos de consulta da administração pública nas principais escolhas da nossa vida coletiva, desejavelmente obrigatório no que respeita o processo de integração europeu. É indispensável a fim de melhorar a qualidade nas tomadas de decisão, favorecer a sua maior legitimação e adequação aos fins propostos, contribuir para a criação de uma cultura de responsabilidade. 

3. Melhorar, de forma significativa e em tempo útil, os mecanismos previstos e a criar de acesso à informação, assegurando maior transparência nas decisões, maior eficácia no escrutínio, maior prestação pública de contas. 

4. Alargar e reforçar, no plano legislativo, o regime de incompatibilidades, alargando-o aos eleitos pela AR, (a escritórios de advogados e à prestação de serviços de consultoria), aos membros do Governo e aos que integram os seus gabinetes (aí incluídos executivos Regionais e locais), bem como aos que exerceram funções específicas (serviços de informações e magistrados, por exemplo) fixando períodos de nojo mais alargados (5 anos) que condicionem o efetivo desempenho de funções na área tutelada. 

5. Fixar um regime de publicidade de rendimentos – à semelhança do existente para titulares de órgãos públicos – para os jornalistas, pela natureza da função que exercem, suscetível de condicionar a opinião dos cidadãos e a sua vontade. 

6. Alterar o regime de financiamento dos partidos e associações, nomeadamente tornado obrigatória a sua publicitação e exercendo maior escrutínio que previna o conflito de interesses, essencial para a prevenção da corrupção. 

7. Proceder à revisão do ordenamento jurídico aplicável ao território pela administração local, prevenindo riscos de corrupção no mesmo sentido. 

8. Condicionar, criminalizando, a alteração injustificada do uso de solos, uma das vias indiretas de enriquecimento ilícito, evasão fiscal e, no âmbito da administração local, de financiamento de partidos. 

9. Combater eficazmente à fuga, evasão fiscal e fuga de capitais; 

10. A publicitação de todos os contratos de concessão que, em nome do Estado português estão a ser celebrados e cuja dimensão pode contribuir para assumir pesados encargos futuros. Exemplo disso, os cerca de 40 contratos de concessão celebrados, no último, ano com a atribuição de licenças de exploração de recursos geológicos e mineiros e cujo teor se desconhece. 

11. Combater a iliteracia politica através da criação de uma disciplina de organização politica e administrativa que dê aos cidadãos uma noção geral sobre o sistema político. 

12. Modificar radicalmente os mecanismos de participação cívica existentes (iniciativa legislativa popular, petição ou ação popular) de modo a torna-los operativos e eficazes e capazes de sentido aos propósitos que lhes subjazem: o reforço da democracia direta, participativa e de base.