por João Seixas
A cidade deve ser estratega. Governando de forma atenta e pensada, pouco atreita a ‘vaipes’ populistas. Com um verdadeiro planeamento, técnico só depois de estratégico. Sabendo que se vive numa era de transição, com muita desorientação. Defendendo princípios sólidos: o direito à cidade, ao habitat, à mobilidade; a inclusão social, o consumo sustentável, o empreendedorismo local.
A cidade deve ser democrática. Sabendo que o futuro só se fará com a sociedade, não longe ou contra ela. Com auscultação, participação e inteligência dialéctica. Com processos como os orçamentos participativos, a Agenda Local XXI, os conselhos de bairro e de cidade. Construindo um urbanismo participativo e de proximidade. Construindo compromissos, o que implica ganhos, cedências e responsabilidades para as diferentes partes.
A cidade deve ser geográfica e ambiental. Olhando-se de forma integrada, pequena cidade ou grande metrópole, nas suas formas, funções, coesões e identidades. Consciencializando-se que a louca expansão imobiliária e auto-estradística baseada no crédito bancário e no endividamento social e ambiental foi das principais causadoras desta crise. Sabendo que não pode ocupar mais espaços naturais e agrícolas, e que se deve dedicar plenamente à revitalização da cidade existente. Através de um urbanismo detalhado, homeopático, de acupunctura. Defendendo a reabilitação urbana, mas numa perspectiva de efectiva ocupação humana, e não de mera ocupação financeira e especulativa. Construindo excelentes redes de transportes colectivos e uma mobilidade real e eficazmente democrática. Sustentando assim uma urbanidade de futuro, com densidade, qualidade de vida e reduzida pegada ecológica.
A cidade deve ser social e económica. Pugnando por um desenvolvimento realmente económico que valore as oportunidades, a criatividade, o emprego, e a justa distribuição destes. Quanto mais dinâmica e diversa for, incluindo no seu empreendedorismo, mais exponenciará a vitalidade económica e o emprego. Boas e fortes políticas de qualificação dos habitats, dos transportes e das micro-economias urbanas, podem tornar-se as melhores bases para um novo New Deal económico e social na Europa, motores de uma verdadeira recuperação.
A cidade deve ser cultural. Multi-cultural. Trans-cultural. Multiplicando os momentos e os espaços, públicos e privados, para as mais diversas experimentações e possibilidades. Apoiando plenamente todo o fervilhar e potenciar de sonhos e de ideias. Sabendo, tranquila, que a cultura não é um custo, é o maior dos investimentos. Tendo uma atitude de franca abertura face ao diferente e ao recém-chegado. A cidade deve ser, portanto, uma completa agenda de futuro. Parte central da saída da crise está na cidade, pelo que ela tem de energia, de criatividade, de riscos e de compromissos. É certo que no estado em que estamos, num país centralista, desorientado e mal governado, considerado pecador e como tal sob castigo, este será um caminho difícil de trilhar. Mas também por isso mais vital se torna a construção destes caminhos.