O Orçamento da Saúde:
riscos agravados para o funcionamento e para a qualidade do SNS


Com o Orçamento de Estado para 2014, o Governo aprofunda a opção de empobrecimento do país em nome da austeridade. Com o corte previsto de 300 milhões de euros, é também um orçamento que agrava a saúde dos portugueses.


O Governo insiste em colocar os interesses dos credores acima dos interesses da população portuguesa e, sem negociar alternativas, opta pelo desmantelamento do Estado Social em nome do pagamento de uma dívida que continua a aumentar e que é insustentável. O Governo decide medidas que são um ataque dirigido a trabalhadores e pensionistas e que agravam a desigualdade em Portugal.

Na saúde, os efeitos deste OE serão:

1. Cortes, cortes e mais cortes. No Relatório do OE2014, o Governo continua a afirmar que “Portugal apresenta ainda um nível de despesa pública desproporcionado face ao seu rendimento”. Essa afirmação é contrariada pelos dados objetivos: já em 2011 os dados da OCDE mostravam que a despesa pública com a saúde em Portugal representava apenas 65% da despesa total com a saúde, enquanto a média na União Europeia era de 72%, e que a despesa per-capita com a saúde em Portugal era de 2619 USD, enquanto na UE27 atingia 3339 USD. Desde então, o financiamento do Serviço Nacional de Saúde diminuiu brutalmente, muito para além do acordado com a troika. Esta contenção da despesa é ainda mais grave pelo facto de, a partir de 2010, o SNS ter assumido os encargos dos subsistemas públicos de saúde. Como consequência deste subfinanciamento, assiste-se ao crescimento da dívida do SNS e à discussão da impossibilidade de manter a qualidade e a universalidade. Ainda assim, o Relatório do OE2014 propõe que as transferências do Orçamento do Estado para o Serviço Nacional de Saúde diminuam de 7.882,5 milhões € de financiamento estimado para 2013 para 7.582,1 milhões € em 2014, ou seja, que tenham um corte de 300 milhões €.

2. Pior qualidade clínica e organizacional e menos segurança na prestação de cuidados de saúde. O Relatório do OE2014 refere querer “reforçar a aproximação dos cuidados de saúde aos cidadãos, investindo nos cuidados de saúde primários e nos cuidados continuados e paliativos“ e “assegurar a redução da despesa, aumentando em simultâneo a qualidade dos serviços prestados” — bonitas palavras, sem qualquer ligação à realidade. A reforma dos cuidados de saúde primários está não só estagnada como em retrocesso, graças ao desinvestimento na qualificação destes cuidados. E, tal como a Reforma do Estado, a Reforma Hospitalar referida no Relatório do OE2014 é pretexto para asfixiar e piorar o funcionamento dos serviços hospitalares, desmantelar redes de cuidados que estavam estabelecidas e alienar património do SNS. A reforma hospitalar do OE2014 consiste na entrega às misericórdias da gestão de hospitais públicos do SNS, sem concursos públicos, sem pré-condições de qualidade e depois dos avultados investimentos que todos fizemos para os apetrechar; ao mesmo tempo que se continua a adiar o projeto do novo Hospital Oriental em Lisboa, essencial ao SNS por implicar a requalificação de seis hospitais públicos, sendo entretanto a sua projetada construção pretexto para más decisões. A reforma hospitalar do OE2014 consiste na promoção da competição por financiamento entre as unidades de saúde públicas, realidade perversa e contrária à lógica de funcionamento articulado e em rede, em simultâneo com o estrangulamento dos cuidados primários e da saúde pública e a desproteção dos utentes.

3. Aumento da despesa suportada diretamente pelos portugueses. A proposta do OE2014 deixa implícito que haverá atualização das taxas moderadoras nas consultas de especialidade e nas urgências hospitalares. Vamos continuar a dificultar o acesso e a assistir ao adiamento dos cuidados por tantos utentes que deles precisam? Vamos continuar a penalizar duplamente quem adoece?

4. Condições de trabalho mais penosas no SNS. Continua ausente uma política para a qualificação e renovação dos diversos profissionais do SNS, assistindo-se à precarização das relações laborais, com menos direitos e com mais horas de trabalho remuneradas a valores inferiores. A proposta de alteração dos regimes de trabalho apresentada no OE2014 traduzir-se-á em menor segurança clínica, com riscos de degradação da qualidade na assistência e nos cuidados prestados.

Denunciamos o OE2014 pelos riscos que comporta para o funcionamento e a qualidade do nosso Serviço Nacional de Saúde. É um mau Orçamento, que deverá ser recusado!

Grupo de trabalho da Saúde do CDA