Estado Social, Direitos e Democracia
Os portugueses sabem que a edificação do Estado social foi o maior investimento que Portugal fez, em democracia, para a fundação dos alicerces de um futuro nacional autónomo e digno. Em vez do país assolado, em 1974, por pobreza e analfabetismo, a liberdade de Abril, a democracia e uma Constituição justa trouxeram a Portugal um desígnio de coesão social e modernidade. A universalização do sistema educativo e do SNS, o crescimento do Estado Providência em todas as suas dimensões, garantiram aos portugueses melhor qualidade de vida e melhores instrumentos para enfrentar os desafios de um futuro exigente no quadro da integração europeia. O retorno desta capacitação nacional faz prova no recuo, inimaginável algumas décadas atrás, das taxas de mortalidade infantil, e também no meritório nível académico alcançado pelas gerações que se formaram em democracia. Com a aposta no Estado Social, Portugal percebeu que a sua principal riqueza eram as pessoas, enquanto cidadãs e enquanto trabalhadoras.Ao cabo de quase quatro décadas, este projeto nacional prossegue válido e, em muitos aspetos, continua ainda por cumprir, como atestam a pobreza persistente, a elevada desigualdade e a escassa mobilidade social que caracterizam a sociedade portuguesa.
Mas é precisamente este Estado Social congénito à democracia portuguesa, e ainda por cumprir, que hoje se encontra ameaçado. No quadro de um resgate financeiro que tem servido de justificação à governação para uma deslealdade constitucional continuada, são postas em causa as vantagens e finalidades do Estado Social. Atribuem-se-lhe responsabilidades sobre défices e dívidas públicas, no contexto de uma crise que lhe é fundamentalmente alheia. Certo é que pelo viés de um memorando de entendimento que pugna pela refundação minimalista do Estado Social, a governação actual propõe-se desmantelar o património mais importante da democracia portuguesa.
E, contudo, os portugueses sabem também que pouca democracia lhes sobrará se não lhes valer este Estado Social. Na continuidade do Estado Social está, pois, em questão a própria continuidade do regime de Portugal.
Este é o quadro geral grave que o país enfrenta e que suscita desafios à reflexão e posicionamentos sobre o Estado Social no Estado de Direito democrático em vertentes como:
1. Que direitos socioeconómicos e culturais são fundamentais à continuidade do Estado de Direito democrático?
2. Que princípios e valores devem ser constitutivos ao Estado Social em vista da construção de uma sociedade livre, justa e solidária?
3. Em que é que o Estado Social não tem, por princípio, que ver com a crise financeira económica que atinge Portugal?
4. Em que é que as bases do Estado Social respondem aos efeitos sociais da crise e proporcionam meios para a sua superação?
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Os contributos escritos para a conferência Vencer a Crise com o Estado Social e com a Democracia estão abertos a todos os cidadãos, têm uma dimensão máxima de 4.000 caracteres, devem procurar contribuir para a discussão das questões acima colocadas e corresponder aos objectivos e espírito da Convocatória da Conferência. A sua publicação é moderada de acordo com estes critérios.
Economia e Organização do Estado Social
O objetivo primordial do Estado Social é a redução das desigualdades económicas e sociais e o consequente alargamento e aprofundamento das oportunidades de vida. Deste objetivo resultam os dois princípios gerais que estão na base da orgânica e da lógica de funcionamento de sistemas tão diferenciados como o Serviço Nacional de Saúde, a Educação e a Segurança Social públicas: a) a 'desmercadorização': que significa a capacidade de proteger as pessoas das incertezas e dos imponderáveis gerados pelos mercados; b) a 'universalidade': que se manifesta na ampla cobertura dossistemas e no acesso generalizado aos serviços públicos.
A economia do Estado Social não pode ser pensada, nem discutida, somente a partir do binómio despesas/receitas. O Estado Social e as respetivas funções têm um valor económico e social acrescido que ultrapassa a mera visão contabilística. Devemos encarar o Estado Social não como uma mera despesa mas antes como um investimento que, para além de garantir um conjunto de direitos e de níveis básicos de provisão, representa um meio imprescindível para o desenvolvimento económico e humano das sociedades.
O Estado Social é caracterizado pela heterogeneidade e a diversidade de sistemas de provisão (pública, privada e social) e de gestão. As relações entre subsistemas de provisão nem sempre são de simples complementaridade. Os modelos de governação e de gestão nem sempre são os mais adequados. Além disso, a geometria da sua cobertura territorial comporta disfuncionalidades e assimetrias.
A crise só pode ser vencida com o Estado Social e não contra ele. Para isso é preciso encontrar resposta clara para inúmeras questões, entre as quais avultam as seguintes:
1. Como garantir os níveis condignos de provisão em contexto de recessão económica? São as lógicas de provisão, pública e privada, complementares e conciliáveis?
2. A provisão pelo Terceiro Sector é compaginável com as lógicas, princípios e racionalidades que caracterizam os sistemas públicos? Em que dimensões e onde se traça a fronteira?
3. Quais os mecanismos de sustentabilidade que garantem o desenvolvimento dos diversos sistemas (saúde, educação, segurança social, etc.)?
4. Na perspetiva do reforço do Estado Social e do desenvolvimento de que reformas carecem os sistemas públicos de saúde, educação e segurança social?
5. O que se pode e deve fazer para elevar a qualidade da governação ao nível dos modelos de gestão, formas de participação e escrutínio cidadão e no âmbito da articulação de diferentes níveis de governação?
6. Que estratégias a União Europeia deveria adoptar no sentido de preservar o modelo social europeu?
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